quarta-feira, 10 de março de 2010

Luta pela Dignidade

exercício em discurso directo sobre um objecto
Há quem goste de pernas esguias, glúteos redondos ou seios arrebitados. Há mesmo quem tenha aquelas pancadas bizarras por pés pequenos ou orelhas redondinhas, ou ainda outros que se apaixonam por um piscar de olhos matador ou peculiares covinhas na bochecha. Eu, o que gosto mesmo é de me besuntar em voluptuosos lábios carnudos. Quanto mais redondos melhor, mais tenho o que explorar, o que invadir o que possuir. Lábios de mulher, homem ou mesmo daquelas aberrações metrosexuais, não faz diferença. Sejam eles carnudos e macios, aqui estou eu para os saborear, massajar, acarinhar e celebrar.

Meu pai Jacobs, ensinou-me desde tenra idade a descobrir a essência de uma boa boca. Mostrou-me a diversidade que a natureza tem para nos oferecer, e alertou-me para os erros que podemos cometer se pararmos em mãos erradas.

Numa madrugada, de rompante, já com ar meio gasto e esbatido, meu pai, destapou me e disse me:

- “Mark, se queres manter a linhagem da nossa família, dá te ao respeito. Ser um Jacobs é ser digno.”

Estas palavras acompanham me até hoje, dia após dia. Ser um Batom não é fácil. Todos os dias luto, para defender a minha imagem. Simplesmente abomino, quando olham para nós, e acham que somos um acessório rafeiro padecível de ser usado e abusado em ridículas máscaras de carnaval. Somos esborrachados nas caras rechonchudas de um e outro como se a ninguém pertencêssemos.

Quando chega o dia dos namorados, as mais ousadas, decidem usar-nos como uma caneta de feltro nas inúmeras surpresas que preparam para os seus queridos amantes, cartas, envelopes ou até mesmo carros. O meu pobre irmão nunca mais voltou a ser o mesmo, após um destes dias, em que Maria, uma adolescente em fase de explosão hormonal, decide tirar o pequeno Mike júnior da bolsinha perfumada de maquilhagem da mãe e com ele desenhar 30 corações no carro do seu jovem amado, que mais queria saber o que iam fazer no carro, e não propriamente como ele estava decorado.

Mas nem tudo é mau e desrespeitoso. Ser um baton de marca francesa e tom vermelhão, tem as suas vantagens. Sinto me de todo dignificado, numa daquelas “friend make-up sessions” pré noitada. Uma mão cheia de jovens espevitadas, que dispensam uma hora da sua noite no quarto de banho a “impiriquitarem-se”, para se sentirem belas e confiantes nos meandros da noite.
De mão em mão, de boca em boca sou desejado e requisitado, usado e abusado. Sinto me até um pouco ordinário, mas gosto…

Rita Madeira

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