quinta-feira, 4 de março de 2010

A incrível história do comando Banana



1990. Chove torrencialmente. Um grupo de soldados nus estão debaixo da chuva. À frente destes encontra-se um soldado notavelmente menos bem constituído, sentado numa cadeira também à chuva, a comer bananas consecutivamente, enfiando uma atrás da outra, na boca. No uniforme deste, pode ler-se um nome Silva, por detrás de um risco cosido. Em baixo do nome, surge escrito também cosido, Banana. Ouve-se um apito e um superior manda os soldados regressarem aos seus aposentos. Todos, menos o Banana. Este continua à chuva, sentado, a descascar e a comer banana atrás de banana.
2010.Banana está a dormir. Um despertador toca. Banana levanta-se, como se já estivesse acordado e em piloto automático dirige-se para o duche, onde se ouve a água a começar a correr. O seu quarto está desarrumado, como se não fosse limpo há meses. Na parede está uma boina de comando emoldurada e em baixo desta pode-se ler uma inscrição. – “Parabéns ao comando mais castigado desta corporação” Coronel Paciência.”
Banana está na cozinha. A mesa do pequeno-almoço está uma bagunça, parece a loiça toda de um batalhão, mas apenas se encontra por lá uma cadeira. Os pratos estão cheios de restos de comida. Inteiro, só resta um antigo cacho de bananas apodrecido nos últimos meses/anos. Banana nunca gostou de bananas, mas por uma razão ou por outra, esse foi o nome dado por todos ao longo da sua vida. Banana procura por uma tigela no armário, mas já não existem lavadas. Desiste de procurar e não lhe apetece lavar loiça. Senta-se à mesa e tenta ligar a televisão, o comando de televisão tem os botões todos novos e bem pintados, excepto o Butão de mudar de canal. Este está completamente gasto e até faz uma covinha da forma de um dedo. Banana tenta mudar de canal, mas a televisão não responde, mesmo depois de toda a força deste, para carregar no Botão, ou mesmo depois das várias posições, dadas por este ao comando, para o fazer funcionar.
Na rua, Banana caminha já vestido com o seu uniforme verde. Verde, sempre foi uma cor de sorte para ele. Desde os tempos de tropa, Banana vestir outra cor nunca lhe garantiu felicidade. Após ter sido obrigado a tornar-se reserva do exército (Os superiores diziam – Vai poupando forças em casa, para no caso de acontecer uma guerra, estares bem descansado.), Banana arranjou trabalho como repositor numa Worten e como electricista numa qualquer empresa privada. Em qualquer um dos casos, as fardas vermelhas e azuis, fizeram despedimento inevitável. - Estas cores desconcentram-me. Disse ele aos amigos, por mais de uma vez. Foi então, novamente com uniforme verde, que Banana voltou a encontrar relativa felicidade. (Relativa porque não acredita estar a usufruir das totais capacidades que aprendeu enquanto se formou nos Comandos.) Trabalha nos armazéns do AKI e tem como chefe um ex general do exército, o General Condescendência. À primeira vista, não existe razão para Banana ser feliz neste emprego, mas a função dada pelo ex coronel, permitiu-lhe usar algumas das técnicas aprendidas no exército. Banana é o responsável pela organização do material dentro do armazém, e também o responsável por um dos empilhadores.
É na organização de material onde Banana sente brio e responsabilidade no seu trabalho. Em vez de organizar o material, tal como todos os outros armazéns, Banana escolhe formações militares e armazena o material nessas mesmas formações. Por várias vezes o material esteve em formação de quadrado, losango ou diamante, caranguejo, entre outras. Mas se houve uma formação a qual Banana considerou a sua obra-prima, essa foi a posição Amazonas. No exército, Banana ouviu o mito da formação criada pelo povo protector da floresta Amazónia. Estes, para proteger a floresta, criavam “labirintos naturais” fazendo os adversários desnortear-se e tornarem-se mais fracos, no momento da batalha. O mesmo aconteceu no AKI e pela primeira vez, um adulto, teve de pedir ajuda pelas colunas do armazém e loja, para ser salvo.
Esgotadas as ideias de organização do material, resta o empilhador para Banana se distrair no seu trabalho. Banana cria constantemente jogos e objectivos para não se fartar do trabalho e hoje não é excepção. Com o trabalho todo feito, já nos dias anteriores, Banana decide pôr à prova a sua ferramenta de trabalho. Decide testar a força dos braços do seu empilhador. Para isso começa com apenas 20 paletes. Acção fácil para a sua máquina. Decide então aumentar o número de carga. Trinta, quarenta, cinquenta, sessenta. Neste momento a pilha de paletes é praticamente da altura do armazém, parecendo uma torre de pisa, prestes a ceder para qualquer um dos lados possíveis. Banana decide então colocar mais dez paletes no topo da torre. O empilhador consegue levantar. Banana rejubila com o feito, mas, a meio do percurso, Banana sente os braços da empilhadora a começar a ceder. Tenta, com a força humana, puxar a alavanca responsável pelos braços da empilhadora, para cima, até ouvir o som CRACK seguido de um estrondo enorme. Na loja, todos ouvem o estrondo e viram a cabeça para a proveniência do som. A escuridão propaga-se no armazém e passa até à loja. Esta escuridão não dura mais de um segundo. A luz volta aos dois sítios, e por detrás do pó lançado pela queda das paletes está Banana, com a alavanca na mão e a tentar colocá-la no sítio onde esta saiu. Missão na qual, não é bem sucedido.
Um outro empilhador surge por detrás do de Banana. Nele está Martelo, um colega de profissão de Banana. Não são nem amigos, nem conhecidos. Só sabe o nome dele devido aos mitos surgidos de dentro do armazém, sobre o tamanho da sua ferramenta e sobre a sua pessoa, que ao que parece, nunca ninguém viu. Mesmo a história da ferramenta parece ser um mito, pois nunca foi vista por ninguém conhecido e não se sabe até onde, pode haver uma dualidade no significado da palavra ferramenta. Mas neste momento isso não interessava para Banana, o arranjo do empilhador era o seu objectivo primordial. Martelo explica a Banana o usual do sucedido, o mesmo já lhe acontecera e só com um adaptador especial, é possível consertar a alavanca, este adaptador apenas se encontra numa loja da rua das Amazonas.
A rua das amazonas, para quem não sabe, é provavelmente a rua com mais má fama da cidade de Lisboa. A amazonas ganhou esse nome pela quantidade de meninas selvagens existentes por lá, e pela agressividade com a qual abordam os clientes. De noite ainda é mais sinistra, contrastando com a realidade de dia. Conta-se, o motivo da remoção dos postes de iluminação da rua se deveu ao constante balançar das amazonas com cordas, como se de lianas se tratassem, neste mesmos postes, para tornar a abordagem aos “clientes” ainda mais agressiva. Na TimeOut XXX lê-se a seguinte afirmação – “O Cais do Sodré é uma EuroDisney, comparada com a promiscuidade existente na Rua Amazonas.”
Banana nunca teve sucesso com o sexo oposto e nem na Rua amazonas teve sucesso. Onde todos os dias existia uma rede de prostituição enorme, por Banana se dirigir à tal rua, esta está deserta. A fama de Banana precedia-o, nem as amazonas o queriam. Banana percorre a rua de cima a baixo, mas não encontra a tal loja. Passa para o lado contrário da rua e nem uma loja de ferramentas. Confuso, Banana decide voltar ao armazém.
Ao chegar ao seu posto de trabalho, para sua surpresa, o empilhador estava já arranjado. – Só pode ter sido o martelo. Pensa o Banana. Decide então ir à procura do Martelo. Tal como a loja de ferramentas na rua amazonas, o Martelo não está em lado nenhum. Banana decide perguntar a colegas se alguém o viu. Motivo de gozo para os colegas de Banana. Nunca ninguém viu o Martelo e até se diz nunca ter existido. Banana tenta contrariá-los, mas Banana não tem credibilidade para ninguém.
Dá-se o toque de saída do armazém. Banana espera por todos saírem e nem sinal do Martelo. – Ele só pode estar lá dentro. Banana tenta voltar para dentro do armazém, mas é impedido por um segurança. – Trabalhadores saem às cinco. Responde o segurança. Banana tenta convencê-lo, mas nada feito. Restava-lhe o resto do dia de folga e só no dia seguinte poderia voltar à fábrica. Banana resignado, volta para casa, mas decide investigar e usar todos os meios e artifícios há sua disposição, para descobrir quem, ou o que é o Martelo.

(CONTINUA)

Diogo Abrantes

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